sexta-feira, 13 de novembro de 2009

MISS BRASILIA 1960












































Minha mãe é uma mulher linda. Mesmo deitada na cama onde passa dias e noites há quase dois anos. Mesmo com as pernas atrofiadas e os pés em ponta de bailarina, deformados pela falta de uso e pela recusa em fazer a fisioterapia. Mesmo com o corpo cavado por lesões que já tiveram o tamanho de um continente, e cuja cicatrização lenta exige cuidados e atenção constantes.

Mas o rosto é o mesmo. As maçãs salientes e coradas. O nariz arrebitado – com um dedo do Pitanguy, é verdade. Lábios sensuais e rosados. Dentes perfeitos. E os enormes, penetrantes e vivos olhos verdes. Mesmo nos piores momentos esses olhos mantiveram sua energia e magnetismo, e por isso eu desconfiava que ela sobreviveria – fênix que é.

De onde surgiram todos esses problemas, vocês devem estar se perguntando. Qual o motivo?

Os médicos não sabem responder. Nunca souberam. Minha mãe é um belo enigma. Não é louca, embora muitos a tenham tachado como tal. Chegou a ter sua saúde mental avaliada por uma junta médica organizada pelo próprio pai, psiquiatra, então diretor do Instituto Philippe Pinel. O laudo apontou padrões dentro da normalidade, mas aí é que está: normal ela nunca foi. Levei uma vida inteira para compreender e aceitar isso. Talvez por sermos duas filhas únicas, e nos piores momentos de nossa atribulada trajetória, eu só tivesse ela para contar de verdade.

O fato é que aprendi sozinha a cuidar, proteger e defender minha mãe com unhas e dentes. Uma das falas mais terríveis que ouvi em toda a minha vida foi da psicanalista: “Sua mãe teve você para cuidar dela”. É provável que seja verdade, mas quem vai dizer como poderia ser diferente, como eu poderia não assumir esse papel?

Minha mãe queria ser atriz de Hollywood, tinha até o nome artístico escolhido: Martha Stewart. Cresci rodeada de fotos e posters de astros e estrelas: Tyrone Power, Susan Hayward, Gregory Peck, Steve McQueen. Quem sabe, se tivesse dado vazão a sua energia através dessa profissão, teria sido mais feliz.

Não foi possível realizar esse sonho, mas houve pelo menos um grande momento: aos 20 anos venceu o 1º concurso de Miss da nova capital federal, em 1959, e alcançou a glória. Prêmios, reportagens, fotos nos jornais e uma viagem à Europa para divulgar o café brasileiro, compromisso que cumpriu acompanhada da minha avó.

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